O que nunca foi dito com franqueza sobre as profissões


Profissão é o estado, condição social, papel de um indivíduo que exerce um emprego, ofício ou arte como meio de vida ou ocupação habitual, na qualidade de subordinado ou por conta própria e visando algum tipo de reciprocidade.

Da mesma forma, chama-se profissional uma pessoa que já tem inveterados certos hábitos ou vícios, a saber: “Bêbado profissional”, “Chato profissional”, Ladrão profissional”, “Puxa-saco profissional” e por aí vai.

“Profissão de fé” é uma declaração pública que alguém faz de suas opiniões políticas ou sociais.

É esse sentido lato — que privilegia a rotina, o hábito, a prática usual e metódica de um mister — que adotamos aqui para designar as profissões e as atribuições que a certas criaturas toca cumprir por escolha própria ou pelas inconstâncias da fortuna.

Não estranhe, pois, o leitor encontrar arrolados entre os tradicionais ofícios fabris e as artes criadoras alguns modos de vida cuja inclusão possa parecer inapropriada. É que — pela carga semântica, pelo poder evocativo que têm — seu agente os acolhe de forma tão pacífica e os protagoniza com tão inexcedível zelo, que não podem ser considerados como simples passatempo.

sábado, 15 de agosto de 2009


ONANISTA

Especialista em artes fabris como complemento à educação sexual; aquele que faz punheta; masturbador; punheteiro; que excita os órgãos genitais e produz orgasmo por meio da mão; aquele que presta tributo a Onã. Quando é profissional, pode ser ‘aquele’ ou ‘aquela’.


Comentário:

        Também chamada “bronha” (“Vou socar uma bronha”, p. ex.), a punheta é uma santa e nobre instituição que afirma a independência e estimula e aprimora a imaginação do praticante, ou seja: todo o mundo. Essa arte fabril — quando bem executada — consiste em dar asas à imaginação para retardar ao máximo a apoteose. O bom punheteiro (excluído o retardado que lança mão de revistinha de mulher pelada) será, por conta disso, um bom parceiro de sexo.
O indivíduo que paga para que lhe masturbem não tem amor-próprio. É um herege, um traidor ordinário que cumpre confinar nos calabouços mais esconsos do inferno.
        É preciso ter em mente que não há sacrifício do intelecto que satisfaça as exigências de uma punheta bem sucedida. Há que se estar sempre criando, viajando como os poetas — não os concretistas, por certo, que estes banalizam qualquer bronha. Há felizardos que perpetram prodígios de criatividade, engendram ficções de fazer inveja àquelas famosas do periscópio na banheira com balinhas de menta e a outra, da mão dormente. Chegou ao nosso conhecimento, e vale como lição especial, a bolação de um artista que consiste no seguinte: há uma empregada nova na casa, garota jeitosinha, com ares de songamonga. O maganão coloca uma revista de Carlos Zéfiro sobre o aparador da sala e mede cuidadosamente o quanto dista das extremidades do móvel. Quando a moça termina de varrer o aposento, ele vai lá, mede de novo e constata que ela folheou o precioso documento. Tentar adivinhar o que se passou na cabeça dela durante a leitura é um exercício primoroso de concupiscência a envolver e animar aquele momento mágico e eterno que se segue.
        Missionários, alunos de colégio interno e outros reclusos são especialistas que merecem especial atenção. As múmias (os múmios, no caso) também têm sua história pra contar...

Pano rápido

A mulher abre a porta do banheiro e surpreende o marido se masturbando:
— Que que o senhor ta fazendo aí?
— Lúcia!?... Cê num morre tão cedo...


Você sabia
que antigamente na Inglaterra as pessoas que não fossem da família Real tinham que pedir autorização ao rei para manterem relações sexuais? Quando as pessoas queriam ter filhos, também tinham que pedir consentimento ao rei que, então, ao permitir o coito, mandava entregar-lhes uma placa que deveria ser pendurada na porta de casa com os dizeres: Fornication Under Consent of the King, cuja sigla era F.U.C.K. — daí a origem da palavra chula FUCK.
        Já em Portugal, devido à baixa taxa de natalidade, as pessoas eram obrigadas a ter relações. Esta lei chamou-se "Fornicação Obrigatória por Despacho Administrativo", dando origem à sigla F.O.D.A. Daí a origem da palavra FODA. Já quem fosse solteiro ou viúvo, tinha que ter na porta a frase "Processo Unilateral de Normalização Hormonal por Estimulacão Temporária Auto-Induzida" cuja sigla era P.U.N.H.E.T.A.
Vivendo e aprendendo...


SEMINARISTA

Mancebo destinado à pregação católica e ao celibato eclesiástico, cuja formação compreende duas etapas: a masturbação e a meia.

DONO DE UNIVERSIDADE PARTICULAR

Predador intrujão atuante em negócios diversificados, habituado ao uso de expedientes transversos, que embarca na educação pela porta dos fundos, empolgado com o lucro rápido e falso, sem respeitar qualquer compromisso com a qualidade dos produtos que vende nem com o aproveitamento que possa haurir a clientela que ardilosamente seduz, supostos beneficiários e eternos reféns da inapetência cultural da malta.

Comentário

        A universidade tornou-se uma casa de comércio por grosso, do ramo de diplomas. O cliente é o aluno. O professor (mal necessário) é o estraga-prazeres que tenta dificultar as transações. Por conta disso, o dirigente (especializado em se fazer senhor do alheio) está sempre arquitetando uma treta para atrasar o pagamento dos salários... Quando paga.

Nota

Alguns donos de faculdade estão aumentando suas rendas vendendo cerveja nos quiosques próximos aos campi. Parece que a cerveja não atrapalha o rendimento escolar.



PALESTRANTE

Palrador, cavaqueador especializado na conversação hipnógena sobre assuntos de pouca ou nenhuma importância, com o propósito de induzir o ouvinte a lânguido delíquio, provocando nele a diminuição gradual da atividade orgânica, até prostrá-lo em letargo.

Pano rápido

        O sujeito chega ao local da palestra com quinze minutos de atraso e é advertido pelo porteiro:
        — Por favor, não faça barulho.
        — O quê?! Já tem gente dormindo?

Aos discursos bem se aplica
A lastimosa verdade:
O comprimento medica
A falta em profundidade.
(Eno Theodoro Wanke)

quarta-feira, 15 de julho de 2009

PSICANALISTA

Vanguardeiro da nova ordem comportamental, para o quê criou uma algaravia pós-moderna destinada a eliminar os atributos essenciais da razão (a começar pela clareza) e instaurar uma abordagem dos fatos enigmática e... bem remunerada.


Comentário
        Sem minhas angústias, culpas, desditas e aflições, deixo de ser quem sou, de decidir por onde vou, e não gosto de ser movido pra lá e pra cá à moda do xadrez. Não sou Sartre, a quem jamais custou enfrentar o que quer que fosse, pois não punha emoções em suas construções e, por causa disso, transferiu o problema para “o outro”. Quero deixar intocadas minhas inquietações, conservar meu lado misterioso, pois, sem ele, perco minha identidade e minhas referências. Imponho-me preservar o quarto vazio de Saint-Exupéry, que “talvez não servisse para nada, a não ser para fazer ressaltar o sentido do segredo” e para dar a entender que não é possível desvendar todas as coisas. Não vou me livrar de meus estigmas; eu próprio sou meu perigo e curto a dor e a delícia de todos os padecimentos que me toca levar ao Calvário.
        A psicanálise apregoa que o sujeito já vem marcado pelos desvios e pelas fixações de seus “circuitos pulsionais”; mas, ao mesmo tempo, sugere a possibilidade de rompimento com esses circuitos “aprisionados” e pretende o relança­mento do indivíduo, sabendo que os desdobramentos dessa ruptura são imprevisíveis e podem ser incontroláveis. É por isso que maldigo o novo homem e abençôo a “prisão”. Como posso eu construir minha cidadela, decorar meu templo se o recomeçar a cada instante? Devo esculpir meu próprio rosto, seja ou não destro em manejar o cinzel, ainda que corte uma orelha, como Van Gogh. Não se trata de escapar à realidade nem simplesmente de sofrê-la em silêncio, mas torná-la tangível, lidar a meu modo com o mundo hostil, através da arte, da literatura, da controvérsia, da luta feroz. Jamais comprar feito.
        A cosmética que vem entalhada no modelo analítico impede o envolvimento com a realidade, esconde a face hostil do mundo, desumaniza, vicia o processo de adaptação desenvolvido durante milhões de anos pelo homem.
        Não hesito em afirmar que o sujeito que se agarra a santos e a psicanalistas é um deslavado pulha. A expiação da culpa pelo álcool, por exemplo, é uma escolha mais decorosa, um processo mais sensato e rápido também, já que, além de divertir-se, o usuário ou paciente desce à cova em menos tempo do que o exigido para o analisando livrar-se de seu tirânico mentor. Isso, quando consegue: pela morte, pela inadim­plência, o que for. No que toca à religião — para não me alongar demais, que o assunto aqui é outro —, aceno com a disparidade entre os tira-gostos consumidos nas respectivas liturgias. Se bem que, para enfrentar a concorrência, os globalizados católicos vêm de lançar padres cantantes, “dominique-nique-niques”, e parece que vêm por aí hóstias à calabresa e outras promoções do gênero.
        Diria, mais, que a psicanálise reflete, ao lado da religião, dos cultos esotéricos, dos chás medicamentosos e das drogas imbecilizantes, a imagem de uma fábrica de felicidades a distribuir bem-estar de laboratório, destinado a fazer prosperar uma cultura prozac de deixa-pra-lá. Sem rebeldia, é impossível criar; sem um mínimo de inconformismo, a arte, a literatura, as manifestações culturais restringir-se-iam a uma bem comportada crônica de amenidades.
        O primor de nonsense bolado por Alan Sokal para desorientar os filósofos vanguardeiros está a calhar para o ramo da cura da alma, em que a clareza é tratada com constrangedor desprezo. O psicanalista seria tão mais brilhante e profundo, quanto mais ininteligíveis seus pareceres. Sem falar nos enigmáticos, é claro, e nos mudos. Dizem, até, que os há bonachões e dorminhocos.
        Fico a imaginar o quanto os recursos e ouropéis dessa mistificação não seduziriam um formando inapetente para encarar a concorrência nas ramificações clínicas que exigem massa de conhecimentos específicos e que dependem de equipamentos sofisticados e caros. E me pergunto se não é atraente a vantagem de eliminar o risco do erro, que fica convenientemente camuflado nas charadas e nos silêncios tumulares. E as tentadoras prebendas?
        De outro modo, quem pode garantir que o processo não esteja eivado, de parte a parte, de cerimônias e formalidades de tal gravidade que tornem o ritual desconfortável, antinatural e ineficaz? Sabe-se que o profissional dessa área não tem por costume recusar clientes, ainda que praticamente todos o consultem por modismo, preguiça, frescura ou pulhice. Também é fato assente que são procurados por pessoas de pouca inteligência, dependentes de clichês, incapazes de municiá-los adequadamente e, muito menos, de aproveitar-lhes — quando dão — qualquer orientação. Mesmo nas hipóteses em que o cliente é razoavelmente articulado e o profissional tem cultura e Q.I. satisfatórios, é necessário algum tempo para identificar e catalogar a causa e a motivação da questão proposta, definir a dinâmica do procedimento e avaliar as possibilidades de êxito. De maneira que a coisa, via de regra, vai caminhando no rumo e ao ritmo daquele bolerão interpretado por Pedro Vargas: "... e assim se passaram dez anos ...".
        O que chamam de reformulação ou fortalecimento do ego tende para o culto excessivo da personalidade, para a busca narcísica (“Você precisa gostar mais de si mesmo”). Daí, para um comportamento mal-educado, agressivo, arbitrário, falta pouco se já não vigora. A absoluta liberdade não é deste mundo. O homem é um animal destruidor. Absolutamente livre, acabaria com tudo.
        Há quem sustente que o afeto é excluído da escuta analítica; que esta se limitaria à leitura do pensamento e da linguagem, o que pode levar à substituição das referências pessoais pelas panacéias disponíveis nos escaninhos pré-classificados, tudo para que o psicanalista possa manter o controle da situação, o fio do discurso. Aqui, o problema se aproxima da análise combinatória.
        Já a terapia de grupo, se guarnecermos o adjunto adnominal de aspas (“de grupo”), a expressão ganha a acepção cínica de “fajuto”, “conversa fiada”, etc ... Presta-se a confusões, por certo.
        Embuste ou mandamento místico que negligencia a realidade?
        Como os integrantes do sistema tornam-se, aos poucos, vultos nebulosos dispersos na torrente do fabulário, desdenho o pudor de projetar sobre o cenário o espectro de minha desconfiada imaginação, e arrogo-me o direito de presumir malícias e ambiguidades. Pois bem: se digo ao psicanalista que sonhei estar possuindo minha própria mãe, dentro de um armário de roupas, ele me conforta com as saudades do útero, com o visceral aconchego. Mas se acrescento que, por três vezes, confessa­da­mente, minha mãe tentou abortar-me, ele me convida a pensar, porque não parece fazer sentido a rejeição. Se me queixo de que meu nome é Roberto porque minha mãe idolatrava Robert Taylor e, por isso, acho que meu pai errou em não lhe ter pespegado uns sopapos, só pra deixar de ser corno, vem ele convencer-me de que é fixação no pai, que devo assumir de vez a homos­sexualidade latente e coisa e tal; que preciso comparecer três vezes por semana, em vez de duas; que o patrocinador do convênio está lhe pagando com dois meses de atraso, se eu não poderia...
        Ora bolas! A gente leva mais de sessenta anos para construir uma neurose sólida, confiável, irretocável vem um cara qualquer e insinua que é preciso reconsiderar, começar tudo de novo, alterar o rumo ... e em apenas nove anos ... E não querem que eu fique tenso?!


PSIQUIATRA
Médico especializado no tratamento de doenças mentais, que se distingue do paciente por possuir a chave do consultório.

Pano rápido
O psiquiatra incentiva o paciente:

— Pode me contar desde o princípio.
— Pois bem, doutor! No princípio eu criei o Céu e a Terra...




SEXÓLOGA

Especialista nas questões pertinentes à atividade sexual, que se baseia nos princípios de que a ausência da hipocrisia é suficiente para conferir dignidade a um ato humano e que não existe fidelidade calcada na nobreza de sentimentos.

Comentário

        Sexólogas proliferam num mercado caótico repleto de charlatões que tratam o paciente pela medicina não tradicional.
        À vista da definição destacada em itálico, essas senhoras não conhecem bem o significado do vocábulo “hipocrisia” ou seu ânimo transgressor tem vínculos exclusivos com Woodstock.

Pano rápido

Algumas dicas de uma sexóloga radical e estressada:

— Tenho vinte anos e não transei ainda por que gostaria de iniciar com um namorado fixo.
— Vai ser difícil. Todos se movem na hora H.

— Posso tomar anticoncepcional, com diarréia?
— Eu tomo com água, mas a opção é sua. Pelo menos use copos descartáveis.

— Tenho um amigo que me deseja, mas ele tem um pênis que mede vinte centímetros. Acho
que vai doer muito — o que faço?
— Manda pra cá, que eu testo pra você.

— Tenho dezoito anos e não transei ainda. Tenho medo de não aguentar a dor.
— Dói tanto, que você vai ficar em coma e nunca mais vai levantar. Deixa de ser fresca e dá de uma vez, ô Cinderela!

Rodapé

“Sexo não tem nada a ver com amor, tanto é que o governo me fode há anos e eu não estou apaixonado por ele” (Vagina Súplice)


MÉDICO

Pano rápido

— Onde você estava? — Pergunta a mãe aflita à meninha.
— No quarto, brincando de médico com o Joãozinho.
— De médico?! — A mãe dá um salto na cadeira.
— Médico do SUS, mãe... ele nem olhou pra minha cara.


HIPOCONDRÍACO

Criatura melancólica que, sabedora das traições cometidas pela esposa, em vez de buscar a devida reparação, corre ao médico, manifestando preocupação com a possível ausência de cálcio no organismo, já que os proverbiais chifres — ao cabo de uma semana — insistem em não se fazer visíveis.



HOMEOPATA

Profissional da medicina que trata as doenças pela aplicação de doses infinitésimas de drogas com nomes estúrdios capazes de produzirem efeitos semelhantes aos sintomas das doenças que se pretendem combater.

Comentário
        No século IV a.C., Hipócrates já afirmava que as doenças desapareciam quando tratadas com a mesma substância que as causava. O alquimista Paracelso, no século XV, usou esse processo para tentar curar seus pacientes. Christian Friedrich Hahnemann, por volta de 1800, sistematizou o princípio da similitude e batizou a prática de “Homeopatia”. Há muitos séculos, portanto, os doentes buscam nessa prática alívio para suas queixas. Nenhum se curou até agora, mas a indústria de caixetas e estojinhos estilizados prospera a olhos vistos.


DENTISTA

Profissional da área médica que se dedica ao tratamento das enfermidades dos dentes.

Nota
        Pobre dentista! Além de trabalhar toda a jornada em pé, serve de bode expiatório para as moçoilas aflitas que vão passar as tardes com os amantes. Ou seja: cria fama e não deita na cama... Se bem que, de certo modo, merecem, né?. Ficam perguntando um monte de baboseiras e a gente se esgoelando pra responder, com a boca cheia de ferros, algodão, sugador....

Rodapé
Se dentista é especializado em dente, paulista é especializado em quê?


quarta-feira, 10 de junho de 2009

CRÍTICO LITERÁRIO

Profissional de fina observação e juízo atilado que examina as questões literárias com critério, notando a perfeição e/ou os defeitos de uma obra literária.

Comentário

        Comentando qualquer livro, um crítico literário sugere de uma maneira ou de outra que ele mesmo deveria ter escrito o livro se tivesse tempo, mas que, não sendo possível, ficou satisfeito de ver outros escreverem-no... embora, naturalmente, o trabalho pudesse ter saído melhor...

Exemplos

Camilo Latuzis

        “A temática de Valionas Goitasin em Realité Humaine externa uma visão oblíqua do cosmos, uma composição poliédrica, translacional, plurifacetada, que, não obstante guardar conformidade com o viés original, mostra uma perspectiva calidoscópica, em que se manifesta inquietante presença lúdica estruturada na métrica das orações, a partir da qual se verifica que a verdade é a proposição mais abrangente, porém válida apenas como ponto de chegada, após uma laboriosa construção por parte do sujeito do conhecimento. Depois de demarcar a originalidade do organismo e da percepção, desencava um solo mais fundo, que os precede, uma dimensão anterior à oposição entre sujeito e objeto, entre percepção e linguagem.”

(Camilo Latuzis é professor de Literatura Comparada da UNIMER)



Rosilda Faskenus

        “A ontologia goitasiniana de Realité Humaine é negativa no sentido exato em que trata da Teologia Negativa. Proclama o Ser através do ente, que mais se ilumina se contraposta à inflexão de Heidegger, assinalando uma mudança de ênfase na articulação entre a questão que pergunta pelo sentido do Ser e aquela que interroga a estrutura daquela que formula a primeira pergunta: o Dasein (Ser aí). Só a exibição do modo de ser desse Ser poderia encaminhar a questão ontológica. O lugar do conceito que fora interpretado como realidade humana é, agora, a mansão do Logos, que tem como guardiães os poetas e os filósofos da linguagem.”

(Rosilda Faskenus é jornalista, filósofa, poeta e compositora)



Ariosto Lorena Pugeu

        “Valionas Goitasin debruça-se sobre a mímesis. Busca desvendar os enigmas da transformação do real através dos códigos simbólicos, e o faz com enorme talento. Merecia uma Festschrift, homenagem literária que os discípulos alemães prestam aos grandes mestres. O autor cultiva a predileção pela descontinuidade, paixão pelo fragmento, pela interrupção. O enredo não é linear; há o abalo da unidade semântica e um forte nível de experimentação da linguagem. É possível reconhecer, ainda, influxos de hermenêutica, sociologia e história, sugerindo uma apropriação do instrumental da estética da recepção, procurando mapear atitudes, recriar o passado, identificando uma compreensão histórica, pré-condição para o estabelecimento da semântica historicizante. É preciso deixar bem claro que não li o livro, para que minha crítica pudesse ser isenta e imparcial.”

(Ariosto Lorena Pugeu é especialista em Teoria da Literatura)



Confusote, não?


Nota

        Chama-se “Criticastro “a um crítico reles com fumos de gramático e desejos de agradar a esquerda, dedicado a enaltecer os “nobres feitos” do barbudo Fidel Castro... Aliás, é o que mais se vê por aí... na maior cara-de-pau, gente que se tem por esclarecida, mas que não tem colhões para contrariar os “progressistas”.


EDITOR

Aquele que tem por indústria explorar um mercado que proclama o triunfo do óbvio, da simplicidade, do palatável, da figurinha, sem a menor preocupação com a formação do leitor.

Comentário

        São os editores o veículo pelo qual a grandeza da idéia cede espaço à deificação do banal, à glorificação dos ídolos de pés de barro. Digitando o teclado, ora o cronista menor — comprometido com a mediocridade das coisas, seduzido pela facilidade e a pequenez de fofocar sobre pessoas famosas —, ora o ghost-writer subornado para registrar as peculiaridades e extravagâncias dos tipos de fácil aceitação popular ou convocado para dar fama imorredoura a receitas de rosquinhas preparadas por padeirinhas bem-sucedidas e a desfrutáveis experimentos de transexuais. Incluam-se no rol compilação de provérbios populares elaboradas por mentes preguiçosas e despiciendas normas de etiqueta celebrizadas por colunáveis frívolas e colunistas pedantes, todos esses órfãos de idéias, reféns da bajulação.
        Pelas editoras, os formadores de opinião determinam roteiros e estabelecem glossários para a carneirada fingir que é feliz peregrinando pelos botequins do Rio, pelo pólo gastronômico do Leblon, e dão outras sugestões encontradas nos abecedários, nos magazines de bela roupagem e conteúdo duvidoso.
        Prostitutas surfistinhas são copiadas por redatores, desses que, nas páginas dos jornais de bairos, se propõem a elaborar teses e monografias de qualquer assunto (humanas, técnicas, etc.).
        Egressos do asqueroso BBB escrevem livros — ignorantes que mal ligam duas palavras; a tropa dos jornais e tevês — os que têm e os que não têm talento — sempre encontra apoio para publicar suas crônicas, em sedutor troca-troca; há o filão das fotos, das figurinhas, auto-ajuda, os que “fazem da pena bisturi para dissecar a vida dos contemporâneos” e, sobretudo, os que a usam como turíbulo para incensar as celebridades; na esteira do sucesso do filme Capote, já desovaram dois títulos; da Copa do Mundo, nem se fala.
        Há 5% para João Ubaldo & Cia e traduções importantes, porque eles sabem que há idêntico percentual de quem segue o que dita a própria cabeça.. Cotas! É isso aí! São jogadas nas tais planilhas custo/benefício e presto! Está feita a mágica! Dinheiro! Quem impõe as condições, gosta de e quer dinheiro, a carneirada não sabe o que quer, eis a equação. De repente me dou conta de que estou indo às raias do patético para constatar o óbvio. Um negócio, apenas. Nem sei por que falei tanto até aqui.
(Quem Mais Fala Do(s) Livro(s)), Érico Braga Barbosa Lima, Editora Antigo Leblon
– Depoimento de Rogério S. Barbosa Lima, 2006)

Pano Rápido

        O diretor de uma revista literária:
        — Tens aí algo pra mim, ó poeta?
        — Sim. Um poemeto que foge aos moldes usuais. Há de agradar a alguns
boêmios... pelo menos vão compreende-lo.
        — Então não publico. Para agradar, é preciso que ninguém entenda.

        O escritor telefonou para a editora à cata de notícias sobre um manuscrito que enviara havia já seis meses sem que houvesse qualquer retorno.
        — Era um romance histórico? — quis saber o dono da editora.
        — Não — respondeu o autor. Pelo menos não era quando o enviei.


LEITOR

É simplesmente o ledor, o indivíduo que adquiriu o hábito de ler.

Comentário

        O leitor brasileiro nunca se constituiu. Foi constituído. Tudo lhe foi outorgado, como se ele fosse um imenso autômato. A instrução no Brasil é quase nula, porque nulo é o gosto de instruir-se. Ademais, não há estímulo fora da eventual influência caseira (É o que nos ensina Tobias Barreto em seu “Um discurso em mangas de camisa” ou em outro texto dele cujo título agora me escapa)
        Para simplificar, vamos dizer que há dois tipos de leitores: o leitor movido pela curiosidade intelectual inata, forjado no seio da família, um herdeiro, um leitor de berço, e o leitor-consumidor, alvo da artilharia editorial-publicitária. E o que prepondera é a imagem publicitária. O próprio valor da palavra parece em estado terminal. O que confere méritos à sociedade é, antes, seu desenvolvimento, sua renda per capita elevada do que a solidez dos mecanismos de proteção à educação.
        Os leitores de berço podem até enveredar pelas agruras floridas dos best sellers, mas não são todos. De qualquer modo, seu universo é reduzido, irrelevante para os projetos financeiros dos editores.
        Quem vai formar o leitor?
        Tirando as redentoras e raríssimas exceções, não existe o “leitor”, mas o “consumidor”, e a quase totalidade dos consumidores é mera depositária de concretitudes e soluções finais que os editores são “obrigados” a veicular.

(Quem mais fala do(s) livro(s)?!... – EBBL – Depoimento de Rogério B. Lima, 2006)


LIVREIRO

Comerciante de livros, CDs, charutos, comestíveis, miçangas, chaveiros e outros artigos, que bajula os escritores famosos e trata o autor pouco conhecido como se fosse um inoportuno e insistente vendedor de bobinas.

Comentário

        Em tempos idos, os livreiros faziam as vezes de conselheiros de muito autor ilustre e admitiam funcionários qualificados para orientar os leitores. Atualmente, com raras e honrosas exceções, tornaram-se negociantes que contratam mão-de-obra barata, empregados despreparados, orientados para empurrar goela abaixo dos fregueses as baboseiras dos best sellers e as dejeções dos novidadeiros de plantão.

Pano rápido

        Leandro, cotista de uma dessas universidades feitas nas coxas, trabalha, na parte da tarde, num sebo elegante de Shopping Center. Um belo dia surge um cliente que se encanta com uma bíblia impressa pelo próprio Gutemberg, o bem mais valioso do acervo. O burro, além de atribuir à peça um valor irrisório, dá quarenta por cento de desconto porque, como faz questão de acentuar, folheando o livro com ares de expert, “Um tal de Martinho Luthero rasurou todas as folhas”.
(Quem mais fala do(s) livro(s)?!... – EBBL – Depoimento de Rogério B. Lima, 2006)