O que nunca foi dito com franqueza sobre as profissões


Profissão é o estado, condição social, papel de um indivíduo que exerce um emprego, ofício ou arte como meio de vida ou ocupação habitual, na qualidade de subordinado ou por conta própria e visando algum tipo de reciprocidade.

Da mesma forma, chama-se profissional uma pessoa que já tem inveterados certos hábitos ou vícios, a saber: “Bêbado profissional”, “Chato profissional”, Ladrão profissional”, “Puxa-saco profissional” e por aí vai.

“Profissão de fé” é uma declaração pública que alguém faz de suas opiniões políticas ou sociais.

É esse sentido lato — que privilegia a rotina, o hábito, a prática usual e metódica de um mister — que adotamos aqui para designar as profissões e as atribuições que a certas criaturas toca cumprir por escolha própria ou pelas inconstâncias da fortuna.

Não estranhe, pois, o leitor encontrar arrolados entre os tradicionais ofícios fabris e as artes criadoras alguns modos de vida cuja inclusão possa parecer inapropriada. É que — pela carga semântica, pelo poder evocativo que têm — seu agente os acolhe de forma tão pacífica e os protagoniza com tão inexcedível zelo, que não podem ser considerados como simples passatempo.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

JOGADOR DE FUTEBOL

Praticante do balípodo ou ludopédio, filiado a uma confraria de cafajestes.

Comentário

        Os jogadores brasileiros formam uma casta que se quer privilegiada. Mais paparicados do que qualquer outro profissional — por adolescentes histéricas e retardadas, oligóides em geral, dirigentes homossexual-oportunistas, salafrários, carreiristas, politiqueiros, gananciosos ou, simplesmente, tolos movidos por idolatria feminóide —, meninos de origem pobre, subitamente catapultados ao cockpit de um bólido do último tipo e recebendo salários mensais de duzentos mil reais, não aceitam críticas ao seu destempero: o mundo é deles. Esperam ser julgados exclusivamente pelo seu desempenho profissional, por sua competência em fazer gols ou evitá-los. Seu caráter não estaria sujeito a avaliações. Calhando de quase assassinarem um colega com uma sola criminosa, o que estará em pauta será sua intervenção diante da possibilidade de sucesso da vítima, jamais o dolo, a predisposição patológica, a popular maldade; muito menos, a avaria decorrente do ato delituoso e covarde. Chamam o árbitro de 'professor' e pronto: é a única concessão (formal) que fazem ao respeito pelo semelhante. Como há enorme escassez de talentos, julgando-se inimputáveis no dia-a-dia, esses moços correm sério risco de serem ignorados pelos críticos e estes (se não continuarem inventando virtudes no perna-de-pau), por sua vez, de ficarem desempregados por falta do que comentar.
        Desagradável, também, a tendência a valorizar cada macacada, por mais banal que seja. O sujeito marca o quinto gol de uma surra no Arapiraca, num jogo amistoso, e rola, frenético, pela grama, aos urros, como se estivesse conquistando a Copa do Mundo; ou beija, com fervor de romeiro, o escudo da camisa do vigésimo terceiro clube que defendeu nos dois anos mais recentes. E os ritos tribais das comemorações? Improvisam coreografias que alcançam prodígios de oligofrenia coletiva. É claro que todo o mundo tem direito à sua cota de babaquice; o que se deve evitar é usufruí-la durante o expediente. Afinal, os aficionados pagam é para ver o jogo e supõe-se que seu dinheiro vai remunerar o atleta e que a obrigação de se empenhar esteja inserida no rol de deveres deste. Ninguém é tão dado a estrelismos e galinhagens como o artista de cinema ou de televisão, mas, na hora de representar, esmera-se em fazê-lo da maneira mais profissional possível. Coisa detestável aqueles braços ao alto insuflando a torcida, desatentos ao que ocorre em redor, ou a insistência com que pedem um cartão amarelo para o adversário, por conta de qualquer esbarrão, sem o menor pejo de procederem como delatores e farsantes! Alguns se atiram ao chão, aos prantos, com esgares de soldado ferido em filmes de carnificina, para ressuscitar em três tempos, ativos, sempre com a mãozinha abanando o imaginário cartão. E a abominável hipocrisia dos atletas de Cristo?...
        E que jogadores! Um dos mais famosos deles, o 'fenômeno', fecha os olhos na hora de chutar. Como todos os parceiros jogam em função dele, acaba fazendo alguns gols e acumulando homenagens que nem Pelé recebeu (Evaristo — que não foi nenhum Pelé — por três vezes sagrou-se campeão da Espanha e duas vezes conquistou a artilharia, diante de rivais como Di Stefano, Del Sol, Kubala. Quem fala disso?). Há fichinhas aos montes, desde Denilson até Rivaldo, passando por Alex & Cia. Dos novos, diziam maravilhas de Diego e Robinho. O primeiro, breve estará gordo como o tal do Neto... e enganando como ele. O segundo, corre o risco de pedalar muito sem nunca passar de replicante de Dener, outro enganador.
        A responsabilidade maior dessa canhestra avaliação pode ser atribuída à cultura jornalística atual: põem na pauta o Guga, o Popó, durante seus meteóricos brilharecos, e toca a vender o livro com o respaldo do Sistema Global de Divulgação. De outra forma, como vai vender pouco, ninguém se anima a escrever sobre Maria Ester Bueno e Éder Jofre (Sobre a gigantesca diferença de cartéis, vão dar uma olhadinha na Internet, por favor, que não cabe aqui).
        Some-se a tudo isso a interferência nefasta de espertalhões ditos 'empresários', que se associam a cartolas desonestos e técnicos idem, que colocam jogadores para atuar uma vez na seleção (contra a Venezuela, por exemplo), e valorizam o passe do atleta, que é vendido para clubes europeus, e a quadrilha racha a grana.
        Incluam-se aí as ´escolinhas` (futebol, o cara nasce sabendo, e deve brincar de jogar pelo menos até os treze, quatorze anos — disciplina, teoria antes dessa idade deforma a inclinação do jovem), também os paliteiros de praia, geridos por oportunistas despreparados exercendo comércio ilegal de mercadorias fictícias.
        Acrescentem-se gerentes desonestos que descontam tributos e contribuições dos salários dos jogadores, sem recolhê-los aos cofres públicos e a mixórdia está pronta para ser servida aos incautos.
        Com tudo isso, o mundo conheceu magníficos jogadores (o futebol sempre foi uma coisa bacana). Depois de Maradona, só Zidane, Ronaldinho Gaúcho e Messi teriam lugar entre eles... e só!
        Pobre futebol, vai mal das pernas. Um dia desses, vamos ver reproduzida nos jornais esta notícia veiculada pelo Jornal do Brasil, em 23/10/1915;

São constantes as reclamações que chegam ao Jornal do Brasil contra os jogadores do que chamam de football em plena rua, perturbando o transito, quebrando vidraças e dirigindo improperios entre si e contra as familias, que se vêm prejudicadas e impossibilitadas de chegar às janellas. E o peor é que tudo elles fazem bolas, até de pedras. A ultima reclamação chegada ao Jornal do Brasil veiu de moradores da rua do Rezende.


* Os maiores de todos os tempos, nas formações habituais:


Yashin, Leandro, Beckenbauer, Schirea, Breitner / Puskas, Cruyf, Maradona, Zizinho / Pelé, Di Stefano

Do Brasil:
Castilho, Leandro, Domingos, Figueiroa, Nilton Santos / Zizinho, Jair, Zico / Garrincha, Tostão, Pelé


(Editado e adaptado de crônica do mesmo autor constante da 1ª edição (1999) do livro O Antigo Leblon – uma aldeia encantada, com alterações exigidas pela coerência temporal)


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